Arquidiocese vai recorrer contra indenização de abuso sexual por padres na PB

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A Arquidiocese da Paraíba, que foi condenada a pagar indenização de R$ 12 milhões pelo suposto acobertamento de abusos sexuais de crianças e adolescentes cometidos por padres, informou que vai recorrer "veementemente" contra a decisão da Justiça do Trabalho e que "confia plenamente na Justiça". De acordo com nota assinada pelo arcebispo d. Frei Manoel Delson Pedreira da Cruz, e distribuída no início da noite desta segunda-feira, 21, a Arquidiocese informou que foi instaurado o processo canônico devido desde o recebimento da primeira denúncia para a apuração dos fatos denunciados.

Referindo-se à reportagem exibida no domingo pelo programa Fantástico, a nota diz: "A matéria afirmou que a Igreja Católica na Paraíba está manchada. A Arquidiocese repele vigorosamente tal acusação, porque não existe nenhum processo judicial finalizado com decisão irrecorrível, podendo a sentença ser totalmente reformada." A nota afirma ainda que "a Arquidiocese ressalta que sempre observou e sempre observará pela Fé da comunidade católica, que estará acima até mesmo de desvios de conduta, reafirmando que lutará sempre para combater qualquer prática que atente contra a dignidade da pessoa humana, especialmente daqueles mais vulneráveis."

A nota oficial afirma que trechos do processo judicial foram divulgados pelo procurador do Trabalho Eduardo Varandas mesmo estando sob segredo de Justiça. "O procurador do Trabalho violou explicitamente o sigilo ao conceder indevidamente entrevista, inclusive atribuindo à juíza que prolatou a decisão a responsabilidade pela divulgação ilegal de informações protegidas." A Arquidiocese afirma que "tomará todas as providências cabíveis perante os órgãos competentes para apurar responsabilidades pelo flagrante desrespeito à lei e à ordem jurídica".

E prossegue: "Nitidamente, o protagonista da reportagem, Eduardo Varandas, pinçou trechos de depoimentos prestados sem o crivo do contraditório, omitindo deliberadamente inúmeras contradições dos depoimentos apresentados perante o Ministério Público do Trabalho e perante a Justiça do Trabalho para conferir à matéria o enredo que mais interessava e tentar condenar previamente a Igreja Católica, sem a devida análise pela Justiça até a última instância."

A ação é resultado de investigação conduzida pelo Ministério Público do Trabalho da Paraíba (MPT-PB) envolvendo o uso de menores em serviços religiosos de paróquias do Estado. De acordo com o procurador Eduardo Varandas, o valor da indenização, se confirmado pelo tribunal, será revertido para fundos e instituições que atuam na reabilitação de crianças e adolescentes explorados sexualmente.

Conforme entrevista do procurador ao Fantástico, a investigação apurou que um grupo de sacerdotes pagava por sexo, de forma habitual e sistemática, a flanelinhas, coroinhas e seminaristas. Ao menos quatro padres da Basílica Nossa Senhora das Neves, em João Pessoa, teriam cometido os abusos, segundo ele. Os pagamentos teriam sido feitos em dinheiro e comida. Os padres negaram todas as acusações.

Citado na investigação, o ex-arcebispo d. Aldo di Cillo Pagotto, que renunciou ao cargo em julho de 2016 e atualmente mora em Fortaleza, disse que sua manifestação está contida em carta aberta divulgada à época. Ele teria sido investigado pelo próprio Vaticano sob suspeita de acobertar padres pedófilos. D. Aldo também foi acusado de ter mantido relacionamento homossexual, o que ele sempre negou.

Na carta, ele lembra que esteve à frente da arquidiocese por 12 anos, "tentando participar de forma proativa na edificação da Igreja fraterna e solidária e da construção da sociedade com inclusão e justiça social". Alega, no entanto, que criou inimigos, pois "desinstalei e desagradei muita gente", entre eles "alguns egressos (expulsos de outros seminários), posteriormente suspeitos de cometer graves defecções."

O religioso relata que "não tardaram retaliações internas e externas urdidas por grupos de pressão", inclusive os que se denominaram "padres anônimos". Cita ainda que "matérias sobre a vida da Igreja da Paraíba, descritas de forma unilateral, distorcida, provocatória, foram periodicamente veiculadas, seguidas de comentários arbitrários em redes sociais". Citou também uma "carta difamatória", envolvendo o arcebispo e vários sacerdotes, "arbitrariamente expostos ao escárnio público", acrescentando que a presumida autora da carta responde em foro criminal - a ação contra ela foi julgada improcedente.

D.Aldo informou ter enviado relatórios à Nunciatura Apostólica do Brasil e às demais instâncias da Santa Sé, "como pedido de compreensão e ajuda, porquanto eu não tenha nada a esconder". Ao passar o comando da Arquidiocese para outro arcebispo, ele concluiu: "Por tanto tumulto, embora eu esteja sofrendo muito, permito-me afirmar que conservo a minha consciência em paz. Dissemos não aos procedimentos secretos e vergonhosos. Pressionados de todos os lados, não fomos esmagados."

Em novembro de 2017, d. Aldo e outros padres da arquidiocese foram inocentados pelo Ministério Público da acusação de prática de crimes sexuais por causa da prescrição. O processo, no entanto, continuou na Justiça do Trabalho e teve julgamento em primeira instância.

Procurada pela reportagem, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) informou que não é sua atribuição se manifestar em casos dessa natureza. Em nota, a CNBB informou que a Arquidiocese da Paraíba responde diretamente ao Vaticano. Procurada por telefone e e-mail, a Nunciatura Apostólica, representação da Santa Sé no Brasil, informou que o núncio, d. Giovani d'Aniello, estava indisponível para entrevistas e que responderia à mensagem eletrônica oportunamente. O procurador Eduardo Varandas também foi procurado para se manifestar sobre a nota oficial da Arquidiocese, mas não havia dado retorno até a noite.

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