Bolsonaro terá de mediar interesses, afirmam analistas

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Conciliar os interesses contraditórios entre os seus grupos de apoiadores será o principal desafio do presidente eleito, Jair Bolsonaro, a partir de janeiro de 2019, na opinião de analistas que participaram do seminário Perspectivas 2019: Os Desafios para o Planalto. O evento, realizado nesta quinta-feira, 13, em São Paulo, foi promovido pelo Grupo Estado e o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).

Na visão dos participantes, as forças políticas, econômicas, militares e sociais que foram determinantes na vitória eleitoral de Bolsonaro neste ano deverão colocar à prova a capacidade do futuro presidente de arbitrar conflitos e definir prioridades da nova gestão.

Para eles, esses conflitos já começaram a ocorrer nesta fase de transição entre o governo Michel Temer e o do futuro presidente, que já tem dado expediente com seus principais assessores em Brasília.

Como exemplo, foi citado o papel do vice-presidente eleito, o general Hamilton Mourão, apontado como porta-voz dos militares na atual estrutura de transição. Para o pesquisador da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp-FGV), Fernando Abrucio, Mourão tem desempenhado a função de "ombudsman" do futuro governo.

Abrucio abriu o evento destacando a necessidade de "arbitragem" do futuro presidente entre os interesses de seus auxiliares - seus filhos, que segundo o analista, têm "ambição de poder", os militares e os grupos liderados por Paulo Guedes (futuro ministro da Economia), Sérgio Moro (Justiça) e o futuro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, além do núcleo dos novatos do PSL e as frentes parlamentares no Congresso. "O PSL tem papel importante porque são numerosos e barulhentos. Lembram o PT da década de 90", avaliou Abrucio.

Segundo ele, a duração da "lua de mel" de Bolsonaro com o Congresso será definida pela relação com os parlamentares nas eleições para as presidências da Câmara e do Senado, a ser realizadas em fevereiro de 2019. "Para Bolsonaro, quanto menos candidatos, melhor", afirmou ele. "O embate entre os diversos grupos de sustentação do governo Bolsonaro pela presidência da Câmara é um ponto essencial. A maneira como esta disputa vai se resolver é determinante, pois o governo pode apoiar um nome que talvez não ganhe a eleição", disse.

O pesquisador citou a candidatura do atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), como exemplo de como o ritmo da pauta legislativa pode ser afetado. "Se Maia ganhar a eleição com apoio dos "outros" - fora da base de Bolsonaro -, ele poderá mudar o timing de sua atuação para atender a outros interesses", afirmou. "É claro que Maia sabe da necessidade da agenda econômica e não vai inviabilizar, mas pode não tocar a pauta da maneira como gostaria o governo", comentou.

Ainda de acordo com Abrucio, o sucesso do presidente eleito dependerá da decisão de apostar ou não em prioridades. Para ele, Bolsonaro tem de manter "pouquíssimos assuntos na pauta política" nos primeiros meses de governo. "Quanto mais falar e pautar, pior será. Collor e Dilma (ex-presidentes) são lições que Bolsonaro deveria prestar atenção", afirmou. Abrucio também destacou a necessidade de o novo governo concentrar esforços na agenda econômica, com ênfase na reforma da Previdência. Nesse contexto, ele acredita que o presidente eleito tem de aproveitar para avançar na agenda econômica até outubro de 2019, quando começam as articulações para as eleições municipais do ano seguinte. "Se os candidatos sentirem que o presidente perde popularidade, começam a ficar arredios", disse.

Nesse sentido, a chamada "agenda de costumes" tem de ficar em segundo plano, avaliou Abrucio. Para o economista e pesquisador do Ibre-FGV Samuel Pessôa, o "grande risco é inverter" as agendas. Segundo ele, Bolsonaro não pode "colocar as pautas de valores por cima da Previdência".

Pessoa citou como exemplo o projeto da Escola Sem Partido, que nesta semana foi para a geladeira no Congresso. "É uma pauta que eu até acho que tem fundamento porque alguns livros didáticos têm sinais claros de ideologização, mas acho que a maneira de enfrentar esse problema não é dessa forma autoritária", completa.

O desgaste provocado pela denúncia do Conselho de Controle de Atividades Fiscais (Coaf) sobre o futuro governo de Jair Bolsonaro deverá fazer com que o presidente eleito aumente a aposta na atuação de seus dois "superministros" - Paulo Guedes, da Economia, e Sérgio Moro, da Justiça. A avaliação foi feita pelo analista político Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores.

"Após a divulgação do relatório do Coaf, Bolsonaro passou a contar com menos bases realmente sólidas de sustentação. Acredito que, durante os seis primeiros meses, sua gestão deverá se apoiar fortemente em ações com cunho mais midiático destes dois superministros", comentou Ribeiro. "O Paulo Guedes pode apresentar resultados importantes na economia, enquanto Moro poderá demonstrar avanços na segurança pública e combate à corrupção", afirmou ele.

O evento contou com a participação dos jornalistas Vera Magalhães, Renata Agostini e Alberto Bombig, do jornal O Estado de S. Paulo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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