'Na hora que recebi 1º tiro, sabia que tinha sido do meu pai', diz publicitária

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O primeiro dia do júri do "Crime do Papai Noel", no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste da capital paulista, foi marcado pelo depoimento da vítima, a publicitária Renata Guimarães Archilla, de 37 anos, que sobreviveu a dois disparos no rosto e outro no braço esquerdo em 2001.

Sentado no banco dos réus, o pai dela, Renato Grembecki Archilla, de 58, é acusado de encomendar a morte da própria filha. "Na hora que eu recebi o primeiro tiro, eu sabia que tinha sido meu pai e meu avô", disse Renata.

Com um terço enrolado na mão, a pubicitária falou por cerca de duas horas na tarde desta quarta-feira, dia 1°, para um Conselho de Sentença composto por quatro mulheres e três homens. No plenário 5 da Barra Funda, chorou ao menos sete vezes ao lembrar das brigas judiciais para ter a paternidade reconhecida, do atentado que sofreu, dos 45 dias no hospital e das oito cirurgias que fez para reconstruir o rosto dilacerado pelos tiros. Antes de entrar, pediu que Archilla fosse retirado. "Não tenho coragem de depor na frente dele. Tenho muito medo do Renato."

Archilla responde em liberdade por tentativa de homicídio com duas qualificadoras, motivo torpe e recurso que impossibilitou defesa, além do agravante de ser pai da vítima.

A expectativa do Ministério Público de São Paulo (MPE) é de que ele seja condenado a 20 anos em regime fechado pelo crime e saia do fórum algemado. Mesmo se for condenado, no entanto, a juíza Débora Faitarone, na 1ª Vara do Júri, pode conceder que o réu responda a uma possível apelação fora da cadeia.

"Acredito nos jurados, que são pessoas comuns, como eu. Acredito que, diante de todo meu sofrimento, a Justiça vai ser feita", disse Renata. Para ela, o avô também foi mandante do crime, mas já morreu e não pode ser julgado. "Em função da demora da Justiça, ele não pôde responder pelo que cometeu."

O crime aconteceu há mais de 15 anos. Era uma segunda-feira, 17 de dezembro de 2001, quando Renata parou seu Fiat Palio em um semáforo da Rua Professor José Leite Oiticica, na região do Morumbi, na zona sul de São Paulo. Havia saído da casa do namorado, onde dormiu, e queria chegar cedo ao trabalho, para uma reunião. Eram 8h15.

Um homem vestido de Papai Noel abordou um carro à direita de Renata, parecia que queria vender algo, segundo ela conta. A camisa era grande demais, a barba e o gorro estavam desajeitados. "Depois, ele passou pela frente do meu carro. Me encarou, sacou o revólver e começou a atirar", afirmou. "Ele não disse nada e só atirou na direção da minha cabeça. Foi uma tentativa de execução."

Aos jurados, Renata afirmou que foi ameaçada pelo avô, meses antes do atentado. "A juíza determinou pagamento de pensão alimentícia até os 24 anos, mas até lá muita coisa pode acontecer", teria dito a ela. A publicitária tinha 22 na época.

O atirador era o policial militar José Benedito da Silva, de Sorocaba, no interior, que foi julgado, condenado e já cumpriu pena pelo crime. Em sua agenda, investigadores encontraram o telefone da família do réu, proprietária de um haras na cidade, onde Silva trabalhava como segurança.

Sem ser reconhecida pelo pai, Renata foi criada pelos avós maternos e pela mãe, que morreu de câncer quando ela tinha 16 anos. A paternidade foi alvo de uma ação judicial que durou 12 anos e terminou após confirmação de exame de DNA, mas a publicitária praticamente só teve contato com Archilla em fóruns e cartórios.

"Ele nunca me ligou em um aniversário", disse. "Eu sou vítima disso tudo. Não tenho culpa de ter nascido."

Para o promotor Felipe Zilberman, Archilla arquitetou o crime para que Renata não tivesse direito à herança da família. Já o advogado Rodrigo Senzi, que defende o réu, afirma não haver provas nos autos que aponte seu cliente como mandante da tentativa de assassinato.

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