Juiz de garantias não se aplica em violência doméstica e familiar, decide Toffoli

Notícia
Espaço entre linhas+- ATamanho da letra+- Imprimir




O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Dias Toffoli, decidiu nesta quarta-feira, 15, reduzir o alcance da futura atuação do juiz de garantias, medida prevista na lei anticrime sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro. Conforme antecipou o jornal O Estado de S. Paulo, Toffoli decidiu prorrogar por seis meses a implantação da medida, que não deve ser aplicada para casos de violência doméstica e familiar, nem para os crimes contra a vida - de competência de tribunais de júri - e nem para os processos criminais que tramitam na Justiça Eleitoral.

Em coletiva à imprensa, Toffoli disse que avisou previamente os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sobre o teor de sua decisão, divulgada nesta tarde. Conforme o ministro já havia dito, a adoção do juiz de garantias não deve retroagir nem vale para tribunais superiores, limitando-se à primeira instância.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) havia recomendado que a figura do juiz de garantias já valesse para as apurações em andamento, enquanto a Procuradoria-Geral da República (PGR) se posicionou a favor da implantação apenas em novos inquéritos.

Atualmente, o juiz que analisa pedidos da polícia e do Ministério Público na investigação é o mesmo que pode condenar ou absolver o réu. De acordo com a nova lei, o juiz de garantias deverá conduzir a investigação criminal e tomar medidas necessárias para o andamento do caso, como autorizar busca e apreensão e quebra de sigilo telefônico e bancário, até o momento em que a denúncia é recebida. A partir daí, outro magistrado vai acompanhar o caso e dar a sentença.

"Os casos de violência doméstica e familiar exigem uma disciplina processual penal específica, que traduza um procedimento mais dinâmico, apto a promover o pronto e efetivo amparo e proteção da vítima de violência doméstica", observou Toffoli.

O ministro observou ainda que a Justiça Eleitoral é um "ramo da Justiça com organização específica, cuja dinâmica procedimental é também bastante peculiar".

Constitucional

Conforme informou o Estado no mês passado, a maioria dos ministros do STF - inclusive o próprio Toffoli - apoia a criação do juiz de garantias. No entanto, mesmo considerando "constitucional" a proposta, Toffoli considerou que o prazo para a vigência da lei - 23 de janeiro - não era suficiente para a entrada em vigor do dispositivo em todo o País.

"O prazo (da lei) não é razoável nem factível para que os tribunais possam promover as devidas adaptações e adequações. Por isso impõe-se a fixação de um regime de transição mais adequado e razoável, que viabilize, inclusive, a sua adoção de forma progressiva e programada pelos tribunais", observou Toffoli.

Toffoli frisou em sua decisão que a medida foi criada para "reforçar a garantia de imparcialidade" e reforça o modelo de processo penal fixado pela Constituição Federal de 1988. "O juiz das garantias é instituto que corrobora os mais avançados parâmetros internacionais relativos às garantias do processo penal, tanto que diversos países já o adotam", pontuou.

"Mostra-se formalmente legítima, sob a óptica constitucional, a opção do legislador de instituir a figura do juiz das garantias", concluiu. O presidente do Supremo destacou que os tribunais deverão "trabalhar na reorganização e no rearranjo de suas estruturas, o que passará pela adaptação das normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal".

Ações

Depois da sanção da lei anticrime pelo presidente Jair Bolsonaro, a associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) entraram juntas com uma ação no Supremo para suspender a implantação da medida. As entidades sustentam que não há como dar execução à lei "sem provocar aumento de despesas".

AMB e Ajufe alegam que a proposta "não se mostra materialmente possível de ser instituída de forma imediata, seja pela União, seja pelos Estados da federação". Cidadania, Podemos e PSL também acionaram o tribunal.

As ações foram sorteadas para ficar sob a relatoria do vice-presidente do STF, ministro Luiz Fux, mas devido à urgência do assunto e à proximidade da vigência da lei, Toffoli decidiu agir com pressa.

"O relator, se houver pedido de reconsideração, tem competência para analisar, na medida em que foi uma decisão individual. Não tem nenhum problema quanto a isso. O importante é fixar parâmetros que deem segurança jurídica. Cheguei a conversar, sim, com o ministro Fux", disse Toffoli a jornalistas.

Audiência

Antes de anunciar a decisão, Toffoli se reuniu nesta tarde com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, para tratar do assunto. Moro havia se posicionado contra a sanção do dispositivo, mas seu entendimento não prevaleceu. O pacote anticrime foi enviado por Moro ao Congresso, que acabou desidratando a versão original e incluindo a figura do juiz de garantias, vista pelo ex-juiz federal da Lava Jato como um empecilho no combate à criminalidade.

Em sua decisão de 41 páginas, Toffoli atendeu Moro e suspendeu um dispositivo do pacote anticrime que previa que "nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados". Para o ministro, esse dispositivo viola o poder de auto-organização dos tribunais e usurpa a iniciativa deles para dispor de sua organização própria.

Outro item que tinha preocupado o ministro da Justiça era um artigo que impedia um juiz de proferir sentença ou acórdão, caso tivesse acesso a uma prova considerada ilegal.

"Ele (Moro) destacou duas questões contempladas aqui: a questão do rodízio de juízes e a questão do impedimento daquele que tiver acesso a uma prova ilegal de poder julgar o processo. Essas duas questões que para ele eram extremamente fundamentais, além da prorrogação do prazo", relatou Toffoli.

Notícia